Relembre a trajetória dos filmes nas Crônicas da semana
Outro dia mesmo, para ver um filme, a gente só tinha a opção de ir ao cinema - a televisão não conta porque o espectador é escravo do programador, fica à deriva. No cinema também, mas pelo menos pode-se escolher em qual porta entrar.
Paulo Pestana
Publicação:17/10/2014 11:38
Quando surgiram as locadoras de vídeo, foi uma festa; mesmo na tela pequena era possível ver e rever filmes sem esperar as reprises da sessão da tarde. Foi aí que surgiu a Oscarito. Era a primeira locadora especializada em filmes clássicos da cidade, nascida do descontentamento do jornalista James Gama com as outras lojas, que só tinham nas prateleiras os arrasa-quarteirão do momento e pouca coisa mais. Se você quisesse um Griffith, um Tarkovski, só na Oscarito. Era o mesmo com dezenas de diretores de muita qualidade e pouca bilheteria.
Não é que a Oscarito fechou as portas? Já não havia mais como enfrentar tanta concorrência via cabo, streaming ou download, tecnologias que trazem o filme que o freguês quiser, na hora em que quiser. De um introspectivo Bergman a um feérico Fellini, passando por Grande Otelo e produções de Bollywood, está tudo disponível, no formato quiser, dublado ou com legendas.
É triste, até porque ir à locadora, assim como uma visita a uma biblioteca, era um ato cultural, tanto quanto a exibição do filme - ou a leitura de um livro. Hoje as pessoas vão às bibliotecas para estudar, muito mais do que pela literatura que, mesmo que tardiamente, vem sofrendo o mesmo processo de digitalização - e extinção física - dos outros meios.
Mas há outro lado nesta mudança de comportamento. E que permite uma música, um filme ou um livro estarem disponíveis o tempo todo; ou seja, a cultura ganhou uma democratização impensável há algum tempo. Está ao alcance de qualquer um, a qualquer tempo.
Se o sujeito acordar com vontade de ouvir a Nona Sinfonia de Beethoven com Celibidache, por exemplo, é só ir à internet; está lá, para download gratuito ou pago. E se quiser comparar com a versão mais visceral de Karajan também está lá. É o mesmo com Bahiano, Capitão Furtado, Callas ou Gato Barbieri, o que for.
Para os filmes, há serviços de streaming - como Netflix, AppleTV ou Cracker - ou downloads gratuitos; para livros, bibliotecas inteiras.
O fato mais incômodo é que está tudo virando de cabeça para baixo e é preciso se reajeitar. A gente sempre diz que quer mudança, mas quando ela vem dá uma certa apreensão. Nessas horas o ser humano é quase um gato, de tão acomodado.
É só parar para pensar em quantas coisas vimos ser criadas e apresentadas como novidades fantásticas e revolucionárias e que já estão no museu. A começar dos videocassetes domésticos que deram origem às videolocadoras. A vítima mais recente é o DVD. A gente ainda se engana vendo as prateleiras cheias em algumas - poucas - lojas. É uma miragem.
As plataformas de cinematecas virtuais estão se desenvolvendo de acordo com a velocidade das bandas de internet. Estamos entrando num mundo sem tato; você está perdendo um sentido.

Atores Oscarito e Fada Santoro em cena do filme Nem Sansão nem Dalila
Não é que a Oscarito fechou as portas? Já não havia mais como enfrentar tanta concorrência via cabo, streaming ou download, tecnologias que trazem o filme que o freguês quiser, na hora em que quiser. De um introspectivo Bergman a um feérico Fellini, passando por Grande Otelo e produções de Bollywood, está tudo disponível, no formato quiser, dublado ou com legendas.
É triste, até porque ir à locadora, assim como uma visita a uma biblioteca, era um ato cultural, tanto quanto a exibição do filme - ou a leitura de um livro. Hoje as pessoas vão às bibliotecas para estudar, muito mais do que pela literatura que, mesmo que tardiamente, vem sofrendo o mesmo processo de digitalização - e extinção física - dos outros meios.
Mas há outro lado nesta mudança de comportamento. E que permite uma música, um filme ou um livro estarem disponíveis o tempo todo; ou seja, a cultura ganhou uma democratização impensável há algum tempo. Está ao alcance de qualquer um, a qualquer tempo.
Se o sujeito acordar com vontade de ouvir a Nona Sinfonia de Beethoven com Celibidache, por exemplo, é só ir à internet; está lá, para download gratuito ou pago. E se quiser comparar com a versão mais visceral de Karajan também está lá. É o mesmo com Bahiano, Capitão Furtado, Callas ou Gato Barbieri, o que for.
Para os filmes, há serviços de streaming - como Netflix, AppleTV ou Cracker - ou downloads gratuitos; para livros, bibliotecas inteiras.
O fato mais incômodo é que está tudo virando de cabeça para baixo e é preciso se reajeitar. A gente sempre diz que quer mudança, mas quando ela vem dá uma certa apreensão. Nessas horas o ser humano é quase um gato, de tão acomodado.
É só parar para pensar em quantas coisas vimos ser criadas e apresentadas como novidades fantásticas e revolucionárias e que já estão no museu. A começar dos videocassetes domésticos que deram origem às videolocadoras. A vítima mais recente é o DVD. A gente ainda se engana vendo as prateleiras cheias em algumas - poucas - lojas. É uma miragem.
As plataformas de cinematecas virtuais estão se desenvolvendo de acordo com a velocidade das bandas de internet. Estamos entrando num mundo sem tato; você está perdendo um sentido.