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25/ABR/2024

Cronista comenta a lista de desejos vs tempo corrido do dia- a-dia

Livros, séries, filmes. Você tem tempo para colocar em dias suas atividades preferidas?

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Publicação:20/02/2015 11:14

 (Arte CB )
Enquanto o inspetor Harry Hole não consegue apanhar mais um assassino serial que vai enfileirando vítimas pela Noruega, Moreira da Silva me espera cheio de malandragem. Embaixo dele, Arthur Miller tem coisas para contar, mas só depois da Remissão de pena, de Patrick Modiano, com quem espero o mesmo envolvimento de Uma rua de Roma. E ainda tem o volume de Thomas Piketty, desconfiado, mas esperando que eu volte para uma nova tentativa de terminar o Capital no século XXI - maçada!, saudade das últimas 50 páginas de Ulisses!

A questão é simples: não há tempo. E ainda querem que eu vá ao cinema ver Cinquenta tons de cinza. Não vou. Não iria de qualquer jeito, nem o livro consegui ler; mas o fato é que a produção cultural do mundo nos obriga, mais que nunca, a selecionar o que fazer, aonde ir, no que investir.


Estamos sempre atrasados. Tenho um amigo desesperado por não terminar de ver a última temporada de Breaking bad - é só alguém falar sobre alguma série de tevê que ele sai de perto, com medo que soprem o final.

E vamos juntando, com medo de acabar e ficar sem, numa paúra sem fim que só não consome mais que a frustração de não conseguir ler, ver e ouvir tudo na velocidade dos lançamentos. Deve ter um nome isso. É alguma síndrome; e tenho companheiros de infortúnio neste eterno atraso de coelho de Carroll.

Sempre aparece uma coisa urgente para atropelar as pilhas e listas. Por exemplo, o disco de Bob Dylan cantando canções que fizeram parte da história da voz de Frank Sinatra. Já ouvi algumas vezes, mas acho que ando desatento. Ainda não entendi. Não consigo nem dizer se gostei ou não; é diferente de destrinchar uma peça musical. É algo aquém dos sentidos, está à flor da pele: tão simples que ficou complicado.

Assim eu vou deixando prioridades para mais tarde. Caso da série O inescrito. Só li um dos nove volumes da história em quadrinhos de Mike Carey e Peter Gross, repleta de referências literárias. No fim do dia, desesperado, vejo que, em vez de diminuir, a pilha aumentou. Pior: cresceu também a lista de desejos, essa maldade que as lojas virtuais inventaram para ficar atentando nosso juízo. Já pensei em buscar ajuda profissional, mas quando eu lembro que com o dinheiro da consulta eu consigo comprar mais dois ou três livros, desisto.

O busílis é que não posso nem ser acusado de lassar a própria vontade ou mesmo de adiar nada. Não adianta dormir menos, organizar as outras tarefas para acabar mais cedo, deixar de dar de comer ao cachorro ou almoçar abraçado a um livro. Como escreveu Lewis Carroll, pai do coelho e de Alice, é preciso correr muito para ficar no mesmo lugar.

Desculpe a pressa e o mau jeito deste texto, mas vocês vão me dando licença: é que eu tenho que ir ali começar a ler a biografia de Getúlio Vargas. E olha que ainda estou no primeiro volume.

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