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18/ABR/2025

Crônica: Paulo Pestana fala da mensagem subliminar por trás da espera

Cronista ressalta a importância de não estabelecer dia certo para começarmos a viver a vida, para sermos felizes

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Paulo Pestana Publicação:08/04/2016 07:00Atualização:07/04/2016 17:45

Como hoje é sexta-feira, você deve estar recebendo um monte de mensagens no celular festejando a chegada do fim de semana. É gente gritando, fazendo macaquice, abrindo cerveja, misturando pinga com limão numa betoneira, tirando a roupa; uma espécie de cerimônia catártica, fenômeno recente, que só é possível por causa das redes sociais com trocas de mensagens, fotos e filmes instantâneos.

É uma alegria só, mas que pode trazer uma triste mensagem subliminar: quer dizer que temos de esperar até o quinto dia de cada semana para começarmos a viver a vida? Devemos acreditar que os outros dias da semana não valem a pena e que sofremos uma síndrome ampliada do gato Garfield das tiras em quadrinhos, que adora lasanha e odeia segundas-feiras na mesma proporção?


Desta forma, a sexta-feira seria visão — miragem? — que o beduíno cameleiro tem do oásis, mesmo que ele saiba que em seguida vai ter mais um bocado de areia para atravessar. E vamos aproveitar enquanto é tempo, brincar de viver, exercer o direito que cada um de nós tem de sair do sério de vez em quando, esquecer que a fatura do cartão de crédito tem sido a única coisa pontual no país nesses dias. Carpe Diem.


O dramaturgo Nelson Rodrigues — sempre ele — foi direto ao ponto: “Sexta-feira é o dia em que a virtude prevarica”, escreveu. Os cínicos podem dizer que a sexta-feira é o dia em que todos querem mostrar que levam uma vida boa, embora não levem, mas que funciona como válvula de escape para frustrações cotidianas.


O dia mágico já foi o sábado. Delicada, Clarice Lispector escreveu que o “sábado é a rosa da semana”; Dorival Caymmy dedicou uma canção às delicias do sábado (“Depois de trabalhar toda a semana, meu sábado não vou desperdiçar”, em Sábado em Copacabana). O domingo é controverso: pode ser o de Billy Blanco, cheio de vida na bossa Domingo azul, ou o de Clarice: “Detesto domingo por ser oco”.


O indiscutível é que nem mesmo as sextas, 13, antes responsáveis por maus presságios e superstições de todos os níveis, têm assustado ninguém — a segunda-feira, ao contrário, parece mais aterrorizante e agourenta do que um poleiro de corvos cegos.


Enquanto a urucubaca parece acompanhar a todos os outros dias da folhinha, a gente vai levando a vida aos sobressaltos, com seis obstáculos a vencer antes de sermos abençoados com o nirvana que, afinal, se revela como uma simples pausa. Porque no sábado mesmo começa tudo de novo.


O ar pesado e pessimista dos nossos dias ajuda a carregar a vida de mau humor e desesperança. E já que é assim, vamos festejar a sexta, mesmo que amanhã, às oito, muitos de nós vão ter que abrir a lojinha, ralar como se fosse segunda.
Melhor que seja companhia de Drummond, que desejou a nós “namoro no portão, domingo sem chuva, segunda sem mau humor, sábado com seu amor. Chope com os amigos, viver sem inimigos, filme na TV. Ter uma pessoa especial e que ela goste de você”.

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