Em crônica da semana Paulo Pestana fala sobre a gastronomia nômade
Os tempos são outros, eu sei. Ainda mais para mim, criado entre tios que usavam gomalina no bigode, sapato bicolor e tinham orgulho das cafajestadas; do outro lado havia o som dos Beatles na vitrola, anunciando que, dali pra frente, tudo ia ser diferente (está certo, isso quem cantava era Roberto Carlos, mas era o que eu entendia no som daqueles quatro ingleses, já que ainda não sabia patavinas de inglês). Mas ainda me assusto.
Estava meio distraído no elevador quando o rapazinho virou-se para a mocinha e disse: “Vamos comer no caminhão?”. Acho que não foi bem assim, direto; misturando inglês com português, a tecla SAP do cérebro traduziu imediatamente a parte em que ele disse “food truck” e a versão veio pior que dublagem de seriado estrangeiro.
Só depois é que me apareceu o reflexo da estupidez: esclareceu-me um amigo que agora o negócio é comida de caminhão, food truck. E eu, atrasado, ainda confundindo a coisa com arroz carreteiro e maionese de batatas na beira da estrada...
Até já tinha visto um filme simpático do Jon Favreau, daqueles que a gente esquece quando a luz do cinema acende. Só lembro que ele era um chef de cozinha e acabou fazendo comida num caminhão, onde ele encontrou a paz perdida entre facas e chiliques num restaurante, numa daquelas mágicas que só acontecem no cinema.
Pois é. Depois de transferirem o carnaval para cima de caminhões, agora os restaurantes também estão sobre quatro rodas. É uma evolução dos trailers de cachorro-quente, das carrocinhas de angu e até do caminhão de sorvete que atraia a molecada com um apito característico. E mais uma involução dos costumes.
O menino que ainda mora dentro de mim se lembra que ir ao restaurante era uma solenidade; aliás, era quase proibido, coisa de adultos, que se vestiam apropriadamente para “comer fora”. No máximo, crianças eram aceitas em churrascarias que ficavam fora dos limites das cidades. Mas era um tempo em que os pais podiam dizer não aos filhos sem causar traumas.
Voltando aos caminhões, fui parar numa pracinha que abrigava vários dos tais food trucks. A primeira sensação é que havia sido enganado. Só tinha Kombi ali. Nenhum caminhão. E olha que nem a Volkswagem fabrica mais Kombi. Era como uma festa que só toca disco de vinil, perdida no tempo.
Mas foi só a primeira impressão. Fora o fato de ter muito trailer de hamburger, a comida mexicana pareceu apetitosa, assim como a árabe e o arroz carreteiro; mas estacionei na frente de uma Kombi com pão de queijo recheado com lingüiça à moda tradicional que vale a pena. O dono é o Herivelto, torcedor do galo, formado em gastronomia, que investiu mais de R$ 100 mil para fazer sua casinha mineira.
O problema é que, como são caminhões (ou melhor, Kombis) eles andam, são nômades. Cada dia num canto. E aí perdem para o cachorro quente do Dudu, um dos melhores da cidade, que está sempre na entrada da 105 do Sudoeste.