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Crônica da semana: Jovens velhos

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Paulo Pestana Publicação:13/07/2018 06:00
—  Eurípedes.
A mocinha tirou os olhos do formulário e voltou a perguntar. “Eu perguntei foi o nome do bebê”. É Eurípedes mesmo. Ainda enrolado numa manta e no colo da mãe, já não tem aquela carinha de joelho, mas está há poucos dias entre nós; só que a criança ainda não tem consciência do nome que vai acompanhá-la até o fim de seus dias.

A escolha foi do pai, disse a mãe, esticando conversa com a atendente do consultório, que não escondeu a surpresa. “Era o nome do avô dele, que o criou”. E trocaram mais algumas frases que não diminuíram o assombro da moça, tanto que bastou a mãe sair de perto para que repetisse ao próximo da fila: “Eurípedes... que nome antigo para pôr num bebê tão novinho”.
Compreendi o pasmo. Eurípedes é nome que carrega polainas e pincenês. Lembrei de Benjamin Button, personagem do conto de F. Scott Fitzgerald que virou filme, nasceu velho e morreu criança.
É mesmo difícil imaginar a mãe gritando para um menininho esperto que corre atrás de uma bola: “Bota um agasalho, Eurípedes!”; “Sai da rua, Eurípedes”. Das duas uma: ou vai ganhar um apelido (Pipi, Pides ou, pior, Pézinho) ou vai ser conhecido como “menino”.
Eurípedes, a gente sabe, foi um poeta trágico grego que se dedicou a relatar histórias de perdedores. Houve muitos Eurípedes depois deste inaugural e não chega a ser um nome surpreendente. Mas a mocinha matou a charada: é um nome antigo.
É como Alcebíades, outro nome que herdamos dos gregos, a partir do general ateniense, que chegou a ser popular no Brasil do início do século passado —  quase sempre apelidados de Bide. Nesses dicionários que dão significado a nomes, Alcebíades é alguém que governa com dureza, mas generosamente.
Tive um colega de infância que era torturado pelo nome. Chamava-se Ambrósio. Para piorar a situação, o pai mandava raspar-lhe a cabeça, deixando apenas um tufo de cabelo perto da testa. E como se não bastasse, era também o primeiro da sala. Ou seja: era o alvo preferido dos coleguinhas —  ninguém sabia o que era bullying, mas todos praticavam.
A mãe dele era devota de Santo Ambrósio, o que devia ser um caso único, porque não é dos santos mais populares embora mereça — foi ele quem definiu o canto antifonal, que é aquela resposta alternada ao canto principal (Ray Charles deve muito ao santo). Não sei por onde anda Ambrósio e nem se ele manteve o penteado.
Ninguém se surpreende ao saber que os nomes mais populares do Brasil são Maria —  há 11,7 milhões delas, muito à frente das três milhões de Anas e Josés (com 5,7 milhões), mas entre os homens nascidos na década de 1990 ganham os Lucas; uma década depois, mais populares foram os Joões, seguidos dos Gabrieis.
Como as calças, os nomes seguem a moda. Assim, será difícil encontrar um bebê chamado Anésio, Astrogildo ou Austregésilo, só para ficar na letra a. Ou Aurisdete, Ermengarda e Hermenegilda, entre as mocinhas. Graças aos céus.

Aspas
“Para piorar a situação, o pai mandava raspar-lhe a cabeça, deixando apenas um tufo de cabelo perto da testa. Era o alvo preferido dos coleguinhas —  ninguém sabia o que era bullying, mas 
todos praticavam.”

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