No filme 'Joaquim', diretor Marcelo Gomes fala sobre Tiradentes
Longa fala do personagem 10 anos antes da consagração
Ricardo Daehn
Publicação:21/04/2017 06:02Atualização: 21/04/2017 11:23
Cena do filme 'Joaquim'
Há uma ironia fina na cena inicial de Joaquim, focado na figura de Tiradentes. Decapitada, a mente do protagonista conta, em pensamento, que optou que o matassem, tendo como recompensa até mesmo o direito a instituição de um feriado no calendário. Pobre e agitado, o personagem vivido pelo disciplinado ator Júlio Machado sofre a ressaca da postura ética e esperançoso no Brasil colonial.
De cabelo curto, o mártir da Inconfidência tem a vida contada no filme histórico assinado por Marcelo Gomes.
Velhos conhecidos dos brasileiros desfilam na tela, como subornos, prestação de favores e tratamento vil reservado a mulheres.
Até a sorrateira conspiração, arquitetada para travar desmandos da metrópole, o retrato do Brasil conversa, em composição, com a preciosidade de um novo clássico como Desmundo (2003). Rigores da selvageria, no Brasil das suçuaranas indóceis e das expedições pelo ouro, parecem sabotar a liberdade apregoada por Tiradentes. Há desencanto na riqueza que transborda das telas, no elegante cinema de Marcelo Gomes.
Duas perguntas // Júlio Machado
Joaquim traz uma atualidade impressionante. Qual é a sua opinião em relação ao nosso momento político?
Penso que os debates sobre nosso momento atual têm caído na tentação da superficialidade e da polarização, com traços de intolerância partidária. É preciso enfrentar nosso espelho, por mais desconfortável que ele seja, parar de tentar encontrar um único culpado para nossas mazelas.
Existiu apenas um Tiradentes, ou o mártir foi multifacetado, na sua representação?
Vejo-o como uma figura multifacetada, “esquartejada” até. A figura dele foi utilizada como inspiração para o movimento da República, depois do ostracismo em que ficou após a morte. Foi utilizada também pela ditadura militar.