'Me chame pelo seu nome' é a grande estreia do final de semana, confira crítica
Novo filme de Luca Guadagnino trata com leveza e emoção o despertar da paixão entre dois homens
Ricardo Daehn
Publicação:19/01/2018 06:00Atualização: 18/01/2018 17:55
'Me chame pelo seu nome': mais do que polêmica, uma história de amor
Se no filme 100 escovadas antes de dormir, o diretor italiano Luca Guadagnino explorou certo desconforto da exposição da vida sexual de uma adolescente e algum tom explosivo do fato; na mais recente obra dele, Me chame pelo seu nome, não há grande elemento de impacto.
Num romance sazonal, nos moldes de Brokeback mountain, o longa estrelado pelos excelentes Armie Hammer e Timothée Chalamet (pela ordem, um homem mais vivido e o jovem que, a princípio, experimenta um flerte a distância) se esbalda na voz do comedimento e da experiência do roteirista James Ivory (diretor de Retorno a Howards end e Uma janela para o amor). Ivory — sob muitas semelhanças com o premiado Maurice (1987) — adaptou para as telas um romance criado na literatura pelo egípcio André Aciman.
Passada num verão ao norte italiano de 1983, a trama enfileira uma gama de grandes sucessos musicais, como Lady lady, Words e clássicos temas de Ravel e Bach. Não fosse um detalhe de gênero (já que trata de dois homens se amando) bem poderia ter incorporado Porque era ela, porque era eu. Como na letra de Chico Buarque, pesa, no filme, o enunciado “sei que o que tinha que ser se deu”. O mundo das descobertas de Elio (Chalamet) compreende sondagem de sentimentos, a coragem de apresentar (a terceiros) lugares secretos do seu cotidiano e uma dose de resguardo.
Esquivo, prudente e nada impulsivo, até o primeiro beijo, retido, Oliver — com a beleza da Antiguidade, um tema desenvolvido pelo filme — será o agente do sacolejar de coração e do corpo de Elio.
A princípio, Oliver seria um ajudante do pai do rapaz destacado para uma breve temporada de prospecções arqueológicas. Uma discreta mão no ombro, entretanto, sinaliza o lampejo do amor elaborado por Oliver e Elio, imaturo, mesmo com enorme conhecimento estimulado pelos esclarecidos familiares — em especial o pai (Michael Stuhbarg, excelente na pele de um homem compreensivo) e a mãe (Amira Casar).
Da fase de negação do amor e de nervosismo até os momentos insones e de incômodo, pela falta de lógica na dança dos sentimentos, Elio oferece um desafio incrivelmente suprido por Timothée Chalamet. Exemplo de nuance está nas cenas em frente ao piano, na qual Elio toca a mesma música com energias absolutamente divergentes.
Se há um porém na condução do longa, ele reside no fim, anunciado por várias vezes. Mas o ponto fraco encoraja um belo (e honesto) desfecho, representando um rescaldo da paixão. Se “o cinema não resolve tudo”, como destaca um falastrão personagem secundário de Me chame pelo seu nome, o tratado de carinho assinado pelo diretor encontra o desengasgo inspirado pela literatura do século 16, roubado de prosa criada por Margarida de Navarra: frente a um amor impossível — seria “melhor falar ou morrer?”. A morte, com harmonia, passa longe das motivações incitadas pelo diretor Luca Guadagnino.
Confira o trailer: