'Saudade' é aposta do cinema nacional como estreia
De Paulo Caldas, 'Saudade' vai buscar o significado da palavra em sua essência
Ricardo Daehn
Publicação:19/01/2018 06:01
A saudade no filme de Paulo Caldas ganha significados diversos
Estabelecer pontes imediatas entre palavras e conceitos junto a imagens de resplendor cinematográfico representa uma proposição complexa, mas tende a desembocar também em obras criativas do naipe de Palavra (en)cantada, um marcante documentário de Helena Solberg. Na mesma linha — sem o rebuscamento visual, mas pleno, em termos de conteúdo — o longa de Paulo Caldas, Saudade, tem por meta buscar a raiz para o entendimento da palavra de teor exclusivo na língua portuguesa.
O apanhado de visões cercado pelo filme de Paulo Caldas é tão amplo quanto diversificado e saboroso. A escritora Adriana Falcão, por exemplo, avalia que a saudade vai contra a natureza das relações contemporâneas, em que todo mundo é descartável. O dramaturgo Zé Celso se desvincula da nostalgia a serviço do drama, mas se esbalda em apresentar a saudade com a faceta mais rica, aquela detida na tragédia. O historiador Durval Muniz nivela a necessidade de nostalgia em todos os humanos, uma vez que, pela origem, foram “expulsos do paraíso”.
Sentimentos bem concretos, ligados ao teor físico, são descritos na mesma medida em que a saudade se qualifica, sempre sob o prisma de artistas, como cerebral, como alicerce de passado e coerência (na visão do compositor Bráulio Tavares) e ainda como meio “menos sólido” de ter aconchego e calor (pelo que opina o cineasta Karim Aïnouz).
Do fado lusitano até correntes líricas, com protagonismo desde o século 13, a saudade, no documentário, ganha as vozes de intérpretes como Dalva de Oliveira, Arrigo Barnabé e Siba. Experiências e expectativas se avolumam em cada um dos relatos que afunilam versões de saudades. Relevantes são as visões do diretor Miguel Gonçalves Mendes que, historicamente, mede o excesso de saudade como elemento que “bloqueia a ação”, restringindo a estagnação de um país do porte de Portugal ao “eterno papel de vítima” de ditadura. A análise de Paulo Caldas é, no mínimo, profunda.
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