Eva Green rouba a cena como a misteriosa Elle

O elemento da perturbação é líquido e certo na obra do celebrado Roman Polanski, autor de títulos absorventes, quando o tema alcança vizinhos estranhos, vide O inquilino (1976) e O bebê de Rosemary (1968). Depois de ameaçar um arremedo de remake para Mulher solteira procura, em Baseado em fatos reais, Polanski mostra a que veio: quer tratar, em formato de filme de câmara (nos moldes dos recentes Deus da carnificina e A pele de Vênus), de processo criativo.

Haverá quem se prenda a grande segredo ou reviravolta inesperada na trama que segue roteiro de Polanski e do inspirado Olivier Assayas (Irma Vep e Clean). Mas isso está em plano menor, no longa que adapta obra de Delphine de Vigan (também editada no Brasil). No thriller, Delphine (Emmanuelle Seigner, desgastada) se sente sozinha, como celebridade do mundo literário, incapaz de atravessar os efeitos do mais recente (e pessoal) livro que publicou.

Vulnerável, num jogo de gato e rato, Delphine arranja companhia: a viçosa Elle (o assombro de poder e sedução representado por Eva Green). Elle parece abusar da fragilidade excessiva de Delphine, perdida entre compromissos, como os constantes seminários. Intriga, admiração exagerada e traços lúgubres entram em camadas, no longa-metragem.

Como em O escritor fantasma (2010), Polanski confirma a vocação para desenvolver trama sobre apropriação de talento e identidade. O estilo cortante de interpretação de Eva Green é um elemento potente no novo longa. Com direção menos tarimbada e refinada do que a de Polanski, talvez os acessos dela ficassem risíveis. Não é caso. Com quê de Trama fantasma, o diretor faz um interessante tratado de uma mulher carente, anacrônica e que parece dispor de um avatar não só para administrar as traiçoeiras redes sociais, mas ainda para dominar a própria existência dela.

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