Crítica: 'Uma casa à beira-mar' é poesia visual
O francês Robert Guédiguian explora as várias faces do luto
![Elementos tão díspares como morte e crise de refugiados são discutos em Uma casa à beira-mar (Agat Filme & Cie/Divulgação) Elementos tão díspares como morte e crise de refugiados são discutos em Uma casa à beira-mar (Agat Filme & Cie/Divulgação)](http://imgsapp.df.divirtasemais.com.br/app/noticia_133890394703/2018/07/13/160328/20180712144113461646o.jpg)
Quem fomos e em que nos transformamos? Com essa dúvida — assinalada de modo sutil no enredo do mais recente filme do francês Robert Guédiguian — Uma casa à beira-mar desfila a alta poesia narrativa do cinema. Guédiguian, mais uma vez, crava na tela sua trupe de sempre: Ariane Ascaride (mulher dele na vida real) interpreta uma atriz e se junta a Jean-Pierre Darroussin e ainda a Gérard Meylan e Anaïs Demoustier.
Mortes se alastram na tela, mas a que mais pesa é justamente abstrata e ligada a ideologias e utopias. Em muito, o discurso do filme faz ponte com o de As invasões bárbaras (2003), do canadense Denys Arcand.
Os burgueses alinhados no filme, circundados por ambiente de beleza arrebatadora; mas tensos pela possível morte do patriarca (o veterano Fred Ulysse) botam à prova seus princípios de felicidade. Perpetuar o restaurante do pai, em um local paradisíaco, poderia ser uma saída para todos.
Eternamente comprometido com componente social, Robert Guédiguian, pouco a pouco, consegue introduzir com naturalidade a temática da crise dos refugiados na Europa.
Cada um com suas dores, os personagens fervilharão, entre choques: Angèle (Ascaride) revê um luto anterior; enquanto Joseph (Darroussin) recorre a lampejos corrosivos para bem conviver com os parentes e Armand (Meylan) quer perpetuar hábitos e desejos paternos.
Com personagens por vezes transgressores, cientes da chegada da velhice e apegados ao que um deles designa “amor imemorial”, o filme engrena, citando Bob Dylan (na trilha) e a arte de Bertolt Brecht (Angèle teria encenado, na carreira, a peça A alma boa de Setsuan — sobre egoísmo e maldade). Além das boas referências, o filme adota desfecho comovente.