Cinebiografia 'Bohemian Rhapsody' não faz jus a Freddie Mercury
Como uma das estreias mais aguardadas, o filme decepciona diante da grandiosidade do lendário cantor
Esqueça a possibilidade de ver algo original na encenação da vida e da obra de Freddie Mercury que, morto em 1991, deixou um legado de quebra de padrões à frente do Queen.
Com estética similar à da transposição de Scooby Doo para a telona, o problemático diretor Bryan Singer (de X-Men) tentou aproximar um ícone dos anos 1970 e 1980 das novas gerações em Bohemian Rhapsody.
Logrou, na verdade, uma cinebiografia a meio caminho da comédia, com linguagens de telefilme e de teleteatro. Venerando a imagem da musa Marlene Dietrich, Freddie (Rami Malek) galga o sucesso — enfrentando preconceitos familiares — que parece ilimitado.
Com uma imagem entre o ator clássico Oliver Reed e trejeitos ocasionais de Sacha Baron Cohen (o Borat), o protagonista Rami Malek surfa com destreza na persona de Mercury, com a ressalva de parecer um homossexual enrustido (na vida fora dos palcos) e com a facilidade de "cantar" com voz mesclada, por computador, ao autêntico canto de Mercury.
Melodramático ("preciso de um amigo" e "preciso de vocês" são algumas máximas do protagonista) e detido por demais na construção do guarda-roupa do roqueiro, além de outras futilidades, Bohemian Rhapsody perde a linha entre entretenimento e foco narrativo.
O filme não vai fundo o tanto quanto foi, por exemplo, o similar The Beach Boys: Uma história de sucesso (2014). Até a chegada ao clímax — a apresentação do Queen no Live Aid promovido no combate à fome na África —, o longa acopla ao enredo revivals de músicas que poucos desconhecem, como I want to break free (com clipe controverso), Who wants to live forever, Love of my life, The show must go on e Somebody to love.
O baú do Queen é tão envolvente, que o filme, a dada altura, investe no clima de celebração de karaokê em fim de festa.
"Somos todos majestades", diz o Freddie da fita que desconstrói e desmembra, em fases, o reinado dele e, como súdito subserviente e medroso, não dá conta da vida pessoal do astro. Peca, severamente, ao canalizar a vida sentimental de Mercury na espécie de muleta representada por Mary Austin (Lucy Boynton). Se propõe a analisar, em minúcias (com humor sob medida), a proposição da banda de criar uma ópera (a Bohemian Rhapsody do título) e a quebra de fórmulas musicais operadas no Rockfield Studios (País de Gales).