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26/ABR/2024

Crônica da semana: A crise no boteco

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Publicação:22/09/2017 06:00
Está difícil conversar no bar. Não por causa do alarido dos inconvenientes ou pela polarização de opiniões —  tanto um como outro são parte da (quase sempre) saudável troca de ideias no democrático espaço. O problema é a sucessão de fatos que tem atropelado as análises, embotado o julgamento e provocado algumas reações primitivas do pessoal.

dia desses, o Faixa entrou afobado no recinto. “Estou há meia hora sem bateria no telefone e sem rádio, o que aconteceu?”. E olha que tinha acontecido coisa. Posto a par das informações mais quentinhas, foi possível entabular análises que não mudam nada, mas dão satisfação a quem participa da roda —  ali, o malho é livre e exercido com rigor de tribunal de exceção.
 
À parte essa necessidade de saber tudo no mesmo segundo, doença disseminada pelas redes sociais e que assume proporções de epidemia, estamos convivendo com um furacão de escândalos. Não há tempo de dissecar um fato —  o tempo, no bar, é outro, como bem sabem as esposas —  e outro logo se sobrepõe.
 
Tião também detectou o problema. Afinal, como é possível coordenar o interesse no depoimento do ex-ministro que entrega o ex-presidente e o Tesouro em notas reais (e outras moedas) encontrado no apartamento do amigo de outro ex-ministro, que já disse que não tem nada com isso e só é dono da chave? Falta tempo.
 
Estou ainda na fase de levantamento de dados, mas desconfio de que já há elementos para a formatação de uma tese: a sucessão de escândalos, por estimular a necessidade de idas mais frequentes aos botecos para rodadas de discussões, pode provocar um aumento nos casos de alcoolismo. Sem falar nas crises conjugais —  “De novo no bar? Agora é todo dia, é?”.
 
O fato é: estamos bebendo mais. E nossas mulheres não entendem a gravidade da conjuntura nacional e a necessidade masculina de comentar as notícias do jornal. Não que elas não se escandalizem com a situação, ao contrário. Mas o pragmatismo feminino não suporta muito as digressões e conspirações que os homens encontram pelos caminhos do noticiário; é a nossa novela, embora tenha muita intriga para pouco sexo.
 
Na semana passada, diante de mais uma avalanche de denúncias, gravações, prisões e operações policiais com nomes esquisitos, o Faixa tentou botar ordem no recinto e, com caneta e papel, pôs-se a listar os fatos mais importantes. Relacionou uns cinco ou seis temas (o sexto era o futebol, relegado à galeria dos desimportantes). De nada adiantou: não saímos do primeiro e sobraram considerações para o dia seguinte.
Mas até agora nenhum tema superou a montanha de dinheiro vivo encontrada na sala do apartamento do amigo do ministro; o gerente Barusco devolveu bem mais que o triplo de dinheiro à Petrobras —  R$ 182 milhões —  mas não tinha foto e nem choro. Dias desses, no meio da resenha, ouvimos a voz de um desconhecido que, do balcão, lobrigava a roda: 
—  Um ditado português diz que vergonha é roubar e não poder carregar. Mudou: vergonha mesmo é roubar e não saber lavar.

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