Crônica da semana: Beber à saúde
Há estudos que mostram que a satisfação com gole é um poderoso serviço contra o estresse
Paulo Pestana
Publicação:06/03/2020 06:06Atualização: 05/03/2020 19:33
Deixamos passar de propósito. Ano passado apareceu um estudo médico dizendo que beber, mesmo moderadamente, faz mal à saúde. Escolhemos não acreditar que uma garrafa de vinho — logo ele, tão bem falado — equivalia ao prejuízo de 10 cigarros. E que tequila pode aumentar o risco de um AVC, ao contrário do que era especulado.
A pesquisa não livra nem as pessoas educadas, que bebem moderadamente — um litro de cerveja ou duas tacinhas de vinho por semana bastariam para aumentar riscos. Mas nas letras miúdas, revela-se que ela foi feita entre chineses, até porque o objetivo era entender por que os asiáticos ficam tontos mais rapidamente.
Há estudos para tudo, com resultados feitos para agradar o freguês. Depende, acho, de quem financia. Já vivemos época em que a margarina deveria substituir a manteiga, que o ovo frito deveria ser banido, que o óleo de canola era incensado, que miojo e mandiopã deveriam fazer parte da dieta das crianças. Tudo mudou.
Na mesa do bar, chegamos à conclusão de que podem estar usando o mesmo truque de Moisés, que levou a proibição divina de não comer carne de porco a seu povo; altamente perecível, o produto causava muitas doenças. Na nossa teoria — sem comprovação científica e feita depois de alguns goles — o governo chinês quer gente mais sóbria por lá.
Cerca de 2,3 bilhões de pessoas neste planeta redondo — e que no caso dos exageros gira muito mais rápido — bebem álcool. Somos minoria e cercados de abstêmios ou, no mínimo, mentirosos. Tirando crianças e adolescentes, sobram 5 bilhões de pessoas; 2,7 bilhões estão vigiando e regulando quem gosta de uma pinguinha, de um licorzinho, do inocente Vermute, até do Biotônico Fontoura.
O Faixa, companheiro de bar, quase um filósofo do hedonismo, sustenta que esses estudos são perda de tempo. A tese é que a bebida alcoólica no copo representa os louros do fim da prova do dia a dia, o momento em que todo o transtorno da vida é sorvido em goles de
recompensa.
"E quem quer ser o highlander?", pergunta ele, lembrando-se do guerreiro imortal que luta para manter a cabeça grudada ao pescoço.
Na contramão dos chineses, há estudos que mostram que a satisfação com gole é um poderoso serviço contra o estresse, que a Organização Mundial da Saúde ainda não reconhece como doença, mas que é a causa de algumas delas. Hans Selye, canadense e um dos maiores especialistas da matéria, sustenta que o estresse é o resultado de uma civilização criada pelo homem, que ele mesmo não consegue suportar. Um trago ajuda.
Mas o principal é que agora chega um novo estudo a dizer que o consumo moderado do álcool traz benefícios à saúde, com a vitamina B da cerveja e antioxidante dos vinhos (quando nada, com o limão da caipirinha...). Nesse estudo nós acreditamos.
Evitando os exageros, seguimos lendo e acreditando em Charles Bukowski: "Se acontece algo de ruim, bebe-se para esquecer; se for algo de bom, bebe-se para celebrar; se não acontecer nada, bebe-se para que algo aconteça".