Restaurantes exploram todos os sentidos em menus degustação
Confira nove casas da cidade que trabalham com o serviço que mescla criatividade, técnica e inovação
Cada etapa da refeição é importante. É valorizando as sensações despertadas à mesa que chefs da cidade investem cada vez mais nos menus degustação. Com a criatividade à solta, eles apostam em matérias-primas especiais e o comensal experimenta, em várias etapas, porções menores de pratos autorais.
É comum a analogia entre essa modalidade e um desfile de moda de alta-costura, feito sob medida e que vai em corrente contrária ao pret-à-porter, ou “pronto para vestir”. Restaurantes como o Aquavit, de Simon Lau, investem pesado na proposta, em que o conhecimento técnico e a capacidade de renovação do chef são postos à prova. Por lá, o efeito surpresa, que pode ser um ingrediente da estação ou um elemento raro captado em alguma viagem gastronômica, é item extra.
O preço pode parecer alto, mas, colocado na balança, o formato vale pelas sensações. “A degustação é um luxo. Trazemos iguarias, produtos da época, criações diferenciadas e um trabalho dedicado, bem finalizado e apresentado com maestria. É o outro lado da gastronomia comercial”, explica Lui.
Depois de 18 anos à frente do Universal Diner, Mara Alcamim volta a investir nos menus personalizados como ponto forte da casa. Numa das propostas, a chef fez releituras de clássicos da cozinha brasileira, como rabada e galinhada. “Em uma época difícil como esta, sair de casa tem que ser surpreendente e valer a pena”, afirma Mara.
O início de um ano, geralmente, vem acompanhado de certo simbolismo. O chef Lui Veronese começa 2016 com ideias renovadas no Cru Balcão Criativo.
Além do novo cardápio à la carte, a casa tem um menu degustação fixo. São cinco etapas por R$ 139, incluindo entrada, aperitivos, prato principal e sobremesa.
“A degustação possibilita mostrar o lado artístico do cozinheiro. É feito para aventureiros, abertos a uma cozinha autoral. Expande os limites da nossa gastronomia”, avalia.
Em janeiro, a degustação segue a seguinte ordem: ceviche sensei (com base de salmão, shoyu e gergelim), carpaccio caprese e ovo texturizado com azeite trufado.
Como prato principal, o comensal opta entre magret de pato com aligot ou pescado com fettuccine de palmito pupunha. Encerrando, a sobremesa batizada de pecado de chocolate leva musse de chocolate belga, baunilha e crocante de biscoito.
Cerrado da Dinamarca
O aquavit é uma casa que trabalha exclusivamente com menu degustação. O chef Simon Lau é dinamarquês, mas faz questão de apostar em ingredientes do cerrado, aliados a receitas do seu país de origem ou a técnicas clássicas de preparo. A casa funcionava, originalmente, no Lago Norte, mas foi fechada em 2013.
Com a reinauguração, no ano passado, foi para o Jardim Botânico. “Quando fui conhecer o lugar, achei lindo. Porém, só me encantei de verdade na hora em que entrei no Orquidário ao lado da Casa de Chá e vi os pés de baunilha do cerrado subindo pelas vigas de madeira” comenta o chef.
O menu muda mensalmente, é necessário fazer reserva e tem valor fixo: R$ 395, harmonizado, ou R$ 280, sem vinho. A escolha dos cinco pratos que integram o menu é feita de acordo com a estação e a disponibilidade dos ingredientes. Já os vinhos de diversas nacionalidades são escolhidos por etapa, um para cada preparo.
A seleção deste mês começa com um gaspacho acompanhado por um bolinho de bacalhau. A sopa fria contrasta com o crocante do bolinho, dando textura ao prato. Em seguida, o chef aposta na terrine de foie gras acompanhada por sorbet de caldo de cana, brioche e abacaxi.
Na terceira etapa, timbale de pescadinha com musse de lagostim servido ao fumet de mexilhões — caldo feito do ingrediente. O último prato salgado é um confit de pato com angu de milho-verde, tamarindo e redução de pato. O preparo vem com um toque agridoce, que combina com a proteína. A sobremesa finaliza a experiência com um fragilité de castanha-do-brasil, um parfait de mascarpone e calda de goiaba.
Cardápio da maioridade
Na virada do dia 31 de dezembro para 1º de janeiro, Mara Alcamim, do Universal Diner, se dispôs a fazer deste ano um tempo de mudança. A motivação são duas datas: os 18 anos do restaurante e o aniversário de 50 anos dela.
“Depois de 18 anos de casa, e de ter aberto o Zuu a.Z. d.Z há dez anos passamos por essa fase de inovar, da cozinha molecular, de seguir os preceitos do slow food”, conta. “Parte do meu cardápio do Universal não pode ser mudado. Como tiro do menu o filé au poivre? Mas tenho que fazer sobreviver a minha criatividade e essa vontade se supre com as degustações”, explica.
Disponíveis no almoço ou no jantar, os menus personalizados ou montados por Mara variam entre R$ 230 e R$ 350 por pessoa, preço, por exemplo, do menu degustação em cinco etapas onde são servidas, entre outras iguarias, a lagosta acompanhada de risoto de beterraba e queijo azul como prato principal. É necessário reserva mínima para seis pessoas.
Outra alternativa é o menu brasileirinho. Casquinha de caranguejo, camarão na moranga, galinhada com pequi e quiabo, rabada com polenta de comer de colher e churrasco (kobe assado com farofa de ovos e arroz biro-biro) figuram entre as receitas
Perfeição à mesa
O grand cru é uma das referências quando se fala de adegas em Brasília, mas, para garantir o sucesso do restaurante, é necessário criatividade. Os responsáveis pelo menu são os chefs Alexandre Aroucha e Leônidas Neto.
“Para janeiro, estamos trabalhando com o menu degustação com reserva de cinco dias de antecedência, isso nos dá tempo para montar a sequência, acertar o vinho e deixar tudo redondo para o cliente”, explica. Depois do carnaval, a rotina se reestabelece e o menu é servido toda segunda, no jantar.
Os menus costumam ter três etapas e ele pode ou não ser harmonizado. Os valores variam, devido aos ingredientes, dependendo do preparo, mas o preço costuma ter um valor aproximado de R$ 100, sem o vinho.
Entre as alternativas que os chefs propõem, a aposta é a salada de lagostim com uma casquinha de tapioca hidratada com leite de coco, regada com molho de limão-china de entrada. “Essa salada é refrescante, por causa do molho e das folhas, enquanto a lagostim não pesa. O prato é leve”, detalha Neto.
De prato principal, polvo com salada de grão-de-bico, feijão-verde e redução de figo. “Esse é um prato mais pesado, pelo acompanhamento, o grão-de-bico o deixa mais forte”, descreve Aroucha.
Itália revisitada
Esqueça a cozinha das nonnas ou massas clássicas de cantinas italianas. No menu degustação de verão do Limoncello Ristorante, a palavra de ordem é reinvenção. Baseado em viagens do casal de gourmands Fabiany Damasceno e Eduardo Macedo, o menu de verão da casa promove o encontro entre o que há de mais moderno na cozinha do país da bota com leve perfume de receitas tradicionais.
Por R$ 150 (ou R$ 270, com harmonização de vinhos pela importadora Zahil), o glutão prova, até março deste ano, receitas leves e com a cara da estação: releitura da salada caprese; lula ao limão; tartar de atum com kiwi; camarão grelhado na espuma de coco e gelatina de Aperol (conhecido pelo drinque Aperol spritz, queridinho do momento); pargo na cama de escarola e musseline com trufas; e, finalizando, verrine Limoncello.
Menu inovador
Antes de inaugurar o Cookers Cozinha Criativa, Fernando Abdalla e Thaiza Pacheco trabalhavam como personal chefs.
Na degustação, uma aposta são os tomates verdes fritos com chutney de tomates maduros. “Empanamos os tomates no fubá e em panko. Depois cobrimos com o molho chutney e parmesão”, detalha Thaiza.
No prato principal, a estrela é o filé-mignon com presunto de parma crocante, acompanhado por risoto de gorgonzola com uvas e sementes de papoula. “Esse prato tem o salgado do gorgonzola, que contrapõe com o adocicado das uvas”, explica Abdalla.
Para a sobremesa, a pedida é o cheesecake de biscoito recheado: a base é feita de maneira tradicional, já a massa, é feita com creme de menta e pedaços do biscoito. A sobremesa é coberta por ganache de chocolate meio amargo.
Ao chegar ao Metropolis Grill, os clientes são recebidos com um drinque de boas-vindas. O proprietário Raphael Campos costuma ouvir sugestões de clientes via internet antes de compor as degustações.
Na casa, o menu degustação para o casal em três etapas, um drinque de boas-vindas e uma garrafa harmonizada sai por R$ 159.
Um exemplo é a sequência que começa com cuscuz marroquino e camarão. “Esse é um prato com texturas interessantes, pois o cuscuz é suave, enquanto o camarão é crocante”, detalha.
Em seguida, o prato principal: filé na manteiga envolto por redução de vinho e alho crocante, acompanhado de arroz cremoso com limão siciliano. “O vinho Enconta do Bairro limpa bem o paladar por ter uma concentração maior de tanino”, explica.
A sobremesa é flor de maçã em massa folheada, coberta por caramelo da casa e acompanhada por sorvete de creme.
Vinho até no molho
Entre as alternativas de menu degustação que encontramos pela cidade, o DOC é uma das casas que apostam no conceito. No restaurante, o cliente pode escolher entre os pratos do menu ou pedir algum preparo especialmente feito para o menu degustação.
A quantidade de etapas fica a critério do cliente, mas costuma girar em torno de cinco preparos. Cada etapa é acompanhada por uma bebida. Mas é comum que seja servido um drinque de boas-vindas, normalmente um espumante. “O espumante é mais ácido e ajuda a limpar o paladar e a receber melhor as receitas”, explica um dos sócios, Marcelo Coimbra.
Entre os preparos que o local oferece em seu menu, Marcelo cita o filé de cordeiro com redução de merlot e farofa de cuscuz marroquino. “Os acompanhamentos mudam de acordo com a sequência, mas essa é uma combinação muito saborosa. A redução dá um toque adocicado ao preparo”, afirma.
No DOC, o cordeiro recebe um toque de merlot no molho
Audacioso e intrigante
Há quem acredite que o potencial emocional de um prato é elevado a várias potências quando ele é combinado ao vinho correto. Por isso, no Trio Gastronomia, o chef Emerson Mantovani não apenas assina as receitas, como também a harmonização do menu de jantar. A próxima mudança do menu está prevista para 8 de fevereiro.
São quatro etapas (R$ 159 por pessoa) que misturam bases da cozinha francesa e italiana com técnicas e criações contemporâneas. A entrada é um creme frio de berinjela defumada com azeite trufado, quenelles de ricota com cream cheese e ervas de provence, geralmente escoltada por uma taça de espumante brut charmat, um prosseco italiano ou um brut tradicional. “Apesar de ser fixo, o menu nunca se repete porque altero os vinhos”, explica Emerson.
O primeiro prato tem a inusitada combinação de pescada amarela com molho cremoso de café, geralmente associado a carnes vermelhas, acompanhado de verduras com temperos indianos. “Faço uma brincadeira como se fosse um café com leite: uso uma base de creme de leite fresco com um pouco de licor de café”, comenta o chef.
O segundo prato é um velho conhecido do público: o clássico filé à Wellington, filé-mignon assado com creme de cogumelos e bacon envolto em massa folheada, escoltado por um adocicado purê de cenoura que traz equilíbrio à combinação. Geralmente, o prato vem junto com vinhos leves e pouco amadeirados.
Para encerrar, creme catalão de laranja e limão ao rum com maçã verde em agar-agar de beterraba e terra de brownie tostado, para cliente aventureiro nenhum botar defeito. “Há comensais que vêm aqui e não entendem a proposta, por ter sabores mais audaciosos, intrigantes. Muita gente vê o cardápio e duvida, mas se surpreende no final. O foco é sempre na meta de criação da casa, um restaurante de cozinha autoral. Baseio-me nisso”, finaliza.
Sobremesa com pegada contemporânea do chef Emerson Mantovani